28 de fevereiro de 2015

Parada forçada da construção do estaleiro deixa vila de São Roque apreensiva

Por Matheus Fortes (Tribuna da Bahia)
O cenário de São Roque do Paraguaçu, distrito de Maragogipe, agora registra um cenário atípico para seus sete mil habitantes. Espaçosas edificações para estabelecimentos de gastronomia e hospedagem são encontrados em todas as partes do pequeno vilarejo, onde está a mega estrutura do Estaleiro Paraguaçu, porém, sem clientes.

O encerramento das atividades no estaleiro – empreendimento voltado para a fabricação de sondas para a exploração de petróleo em águas ultra profundas, além de integração e reparos em unidades off shore, como plataformas e navios especializados – por tempo indeterminado não ocasionou apenas o desemprego dos 7.600 trabalhadores. A suspensão também já está trazendo prejuízo aos empresários que investiram na prestação de serviços pela região.

Aproximadamente trinta empreendimentos, entre restaurantes, pousadas, lavanderias e lojas comerciais de roupas e utensílios domésticos agora sofrem as consequências do interrompimento das obras, com a falta de clientes e um fluxo bem reduzido de pessoas em suas dependências. A situação do povoado tem se repetido em diversos municípios do Recôncavo Baiano, colocando muitos negócios em risco, e assim, deslanchando um efeito cascata que, pouco a pouco, debilita a economia da região.

Além da navegação cega vivida por muitos empreendedores de outras cidades, a crise no estaleiro também vitimou os empresários locais, como foi o caso de Pedro Dias. O comerciante tem um restaurante que passou por uma reforma, em 2013, quando o estaleiro chegou ao pico de sua produção. Motivado pelo crescimento, Dias ampliou a área do restaurante – que passou a ter um espaço três vezes maior – e logo em seguida, ergueu uma pousada com 60 quartos no andar superior do empreendimento. Naquela época, a circulação semanal de pessoas beirava a dois mil clientes.

Vieram as demissões, e o investimento, com expansão da cozinha, compra de móveis e equipamentos novos – e que beiram aos R$ 3 milhões – agora estão pendentes, e sem possibilidade claro de retorno. A último desligamento em massa na obra da enseada, fez a pousada fechar, ocasionou o desligamento de 15 funcionários, além de reduzir consideravelmente as refeições. “A gente se atem muito a Deus, pois estamos realmente sem qualquer direção neste momento, e esperando que a construção volte a ser executada o quanto antes”, declara ele, apreensivo.

Da mesma forma, a pousada Recanto Sertanejo, administrado pela família de Marinalva Assis, agora está com seus 156 aposentos vazios. Desapontada, ela também já mostra arrependimentos por ter ampliado a pousada – que antes da chegada do Consórcio Estaleiro Paraguaçu, possui apenas 60 aposentos. O ciclo de demissões, o encerramento prematuro das parcerias com empresas prestadoras de serviços na obra, foram razões suficientes para demitir os oito funcionários, e evitar gastos com os quais não poderia mais arcar. No período de maior atividade do estaleiro, o empreendimento chegava a hospedar 1460 operários diariamente.

A realidade dramática de quem investiu acreditando no futuro
Agora, todas as atividades de manutenção e funcionamento – que inclui limpeza, recepção e café da manhã – são realizados por Marinalva, seu marido João Mário e o filho do casal Rafael. A administradora ainda lembra que, em 2013, a alta demanda fez com que a família adquirisse novos terrenos para a construção de mais quartos, assim como o aluguel de residências mobiliadas. Com as atividades suspensas, as casas agora estão fechadas.

A pousada Recanto Sertanejo segue a mesma rotina de vários outros que chegaram em São Roque, nos últimos dois anos, com uma estrutura cara, mas sem utilidade, pela falta de visitantes. Aliado a hospedagem e a gastronomia, outros serviços como as lavanderias, e lojas de roupas e utensílios domésticos também precisaram fechar as portas, como relatou Pedro Dias. “O fluxo de novos hospedes caiu drasticamente sem os trabalhadores do estaleiro, e esses comerciantes estão fechando as portas para que o prejuízo não seja maior”.

Enquanto isso, o transporte entre o povoado e municípios também sofreu mudanças severas, afinal, como explica o ex-funcionário da enseada, Jailton Souza, as vans que realizam o translado estão viajando completamente vazias. Fator preponderante para reduzir a frota em 50%. “Os carros que rodam entre o distrito e as cidades de Maragogipe, São Félix e Muritiba estão viajando com pouquíssimos ocupantes”, contou ele. Da mesma forma, as dezenas de canoeiros que se instalaram no rio Paraguaçu para transportar operários entre o povoado e o canteiro de obras, também precisaram achar outro modo de subsistência.

Jailton conta que há pouco mais de oito meses, sua rotina consistia em sair de sua casa em Muritiba na segunda-feira, pela manha, e retornando na quinta-feira, à noite. No povoado ele alugava uma casa com outros operários. Porém, uma das ondas de demissão, obrigou seus colegas a saírem da residência. Sem poder arcar com os custos sozinho, Jailton passou a ir ao distrito e voltar no mesmo dia, em uma rotina mais cansativa, porém cabível ao seu bolso. Algo que também se interrompe agora, com o encerramento das atividades do estaleiro, e a demissão de 200 funcionários.

HISTÓRIA
O projeto do Estaleiro Paraguaçu foi lançando em 2013, com um investimento previsto de R$ 2,7 bilhões, para construir seis sondas que serão utilizadas para a exploração de petróleo em águas ultra profundas, avaliadas em US$ 6 bilhões no total.

O Consórcio Estaleiro Paraguaçu (CEP) é composto por empresas como a OAS e a UTC Engenharia - também envolvidas na operação. Principal cliente do estaleiro, a Sete Brasil - empresa criada pela Petrobras com instituições privadas, e investigada na Lava Jato - também vem enfrentando dificuldades financeiras, e está há cinco meses sem pagar a Enseada Indústria Naval (EIN) responsável pelas obras.

O CEP vai encerrar as atividades nas obras do estaleiro de Maragogipe, neste sábado, 28, segundo informações da Enseada que foram divulgadas nesta terça-feira 24. Por conta da situação, o total de desligamentos da Enseada, entre novembro de 2014 e janeiro de 2015, foi de 1.081 funcionários. Em 11 de fevereiro de 2015, a Enseada desligou mais 350 integrantes. Até sábado, serão demitidos os últimos 100 trabalhadores do consórcio.

TRIBUNA

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