Por Matheus Fortes (Tribuna da Bahia)
O cenário de São Roque do Paraguaçu, distrito de Maragogipe,
agora registra um cenário atípico para seus sete mil habitantes. Espaçosas
edificações para estabelecimentos de gastronomia e hospedagem são encontrados
em todas as partes do pequeno vilarejo, onde está a mega estrutura do Estaleiro
Paraguaçu, porém, sem clientes.
O encerramento das atividades no estaleiro – empreendimento
voltado para a fabricação de sondas para a exploração de petróleo em águas
ultra profundas, além de integração e reparos em unidades off shore, como
plataformas e navios especializados – por tempo indeterminado não ocasionou
apenas o desemprego dos 7.600 trabalhadores. A suspensão também já está
trazendo prejuízo aos empresários que investiram na prestação de serviços pela
região.
Aproximadamente trinta empreendimentos, entre restaurantes,
pousadas, lavanderias e lojas comerciais de roupas e utensílios domésticos
agora sofrem as consequências do interrompimento das obras, com a falta de
clientes e um fluxo bem reduzido de pessoas em suas dependências. A situação do
povoado tem se repetido em diversos municípios do Recôncavo Baiano, colocando
muitos negócios em risco, e assim, deslanchando um efeito cascata que, pouco a
pouco, debilita a economia da região.
Além da navegação cega vivida por muitos empreendedores de
outras cidades, a crise no estaleiro também vitimou os empresários locais, como
foi o caso de Pedro Dias. O comerciante tem um restaurante que passou por uma
reforma, em 2013, quando o estaleiro chegou ao pico de sua produção. Motivado
pelo crescimento, Dias ampliou a área do restaurante – que passou a ter um
espaço três vezes maior – e logo em seguida, ergueu uma pousada com 60 quartos
no andar superior do empreendimento. Naquela época, a circulação semanal de
pessoas beirava a dois mil clientes.
Vieram as demissões, e o investimento, com expansão da
cozinha, compra de móveis e equipamentos novos – e que beiram aos R$ 3 milhões
– agora estão pendentes, e sem possibilidade claro de retorno. A último
desligamento em massa na obra da enseada, fez a pousada fechar, ocasionou o
desligamento de 15 funcionários, além de reduzir consideravelmente as
refeições. “A gente se atem muito a Deus, pois estamos realmente sem qualquer
direção neste momento, e esperando que a construção volte a ser executada o
quanto antes”, declara ele, apreensivo.
Da mesma forma, a pousada Recanto Sertanejo, administrado
pela família de Marinalva Assis, agora está com seus 156 aposentos vazios.
Desapontada, ela também já mostra arrependimentos por ter ampliado a pousada –
que antes da chegada do Consórcio Estaleiro Paraguaçu, possui apenas 60
aposentos. O ciclo de demissões, o encerramento prematuro das parcerias com
empresas prestadoras de serviços na obra, foram razões suficientes para demitir
os oito funcionários, e evitar gastos com os quais não poderia mais arcar. No
período de maior atividade do estaleiro, o empreendimento chegava a hospedar
1460 operários diariamente.
A realidade dramática de quem investiu acreditando no futuro
Agora, todas as atividades de manutenção e funcionamento –
que inclui limpeza, recepção e café da manhã – são realizados por Marinalva,
seu marido João Mário e o filho do casal Rafael. A administradora ainda lembra
que, em 2013, a alta demanda fez com que a família adquirisse novos terrenos
para a construção de mais quartos, assim como o aluguel de residências
mobiliadas. Com as atividades suspensas, as casas agora estão fechadas.
A pousada Recanto Sertanejo segue a mesma rotina de vários
outros que chegaram em São Roque, nos últimos dois anos, com uma estrutura
cara, mas sem utilidade, pela falta de visitantes. Aliado a hospedagem e a
gastronomia, outros serviços como as lavanderias, e lojas de roupas e
utensílios domésticos também precisaram fechar as portas, como relatou Pedro
Dias. “O fluxo de novos hospedes caiu drasticamente sem os trabalhadores do
estaleiro, e esses comerciantes estão fechando as portas para que o prejuízo
não seja maior”.
Enquanto isso, o transporte entre o povoado e municípios
também sofreu mudanças severas, afinal, como explica o ex-funcionário da
enseada, Jailton Souza, as vans que realizam o translado estão viajando
completamente vazias. Fator preponderante para reduzir a frota em 50%. “Os
carros que rodam entre o distrito e as cidades de Maragogipe, São Félix e
Muritiba estão viajando com pouquíssimos ocupantes”, contou ele. Da mesma
forma, as dezenas de canoeiros que se instalaram no rio Paraguaçu para
transportar operários entre o povoado e o canteiro de obras, também precisaram
achar outro modo de subsistência.
Jailton conta que há pouco mais de oito meses, sua rotina consistia
em sair de sua casa em Muritiba na segunda-feira, pela manha, e retornando na
quinta-feira, à noite. No povoado ele alugava uma casa com outros operários.
Porém, uma das ondas de demissão, obrigou seus colegas a saírem da residência.
Sem poder arcar com os custos sozinho, Jailton passou a ir ao distrito e voltar
no mesmo dia, em uma rotina mais cansativa, porém cabível ao seu bolso. Algo
que também se interrompe agora, com o encerramento das atividades do estaleiro,
e a demissão de 200 funcionários.
HISTÓRIA
O projeto do Estaleiro Paraguaçu foi lançando em 2013, com
um investimento previsto de R$ 2,7 bilhões, para construir seis sondas que
serão utilizadas para a exploração de petróleo em águas ultra profundas,
avaliadas em US$ 6 bilhões no total.
O Consórcio Estaleiro Paraguaçu (CEP) é composto por
empresas como a OAS e a UTC Engenharia - também envolvidas na operação.
Principal cliente do estaleiro, a Sete Brasil - empresa criada pela Petrobras
com instituições privadas, e investigada na Lava Jato - também vem enfrentando
dificuldades financeiras, e está há cinco meses sem pagar a Enseada Indústria
Naval (EIN) responsável pelas obras.
O CEP vai encerrar as atividades nas obras do estaleiro de
Maragogipe, neste sábado, 28, segundo informações da Enseada que foram
divulgadas nesta terça-feira 24. Por conta da situação, o total de
desligamentos da Enseada, entre novembro de 2014 e janeiro de 2015, foi de
1.081 funcionários. Em 11 de fevereiro de 2015, a Enseada desligou mais 350
integrantes. Até sábado, serão demitidos os últimos 100 trabalhadores do
consórcio.
TRIBUNA
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